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domingo, 23 de janeiro de 2011

Nas frestas da hora exata

Dizem que sempre sentimos a morte por perto, o que de certa forma realmente faz alguma lógica. Não acredito que ele nunca tenha sentido antes do choque, da notícia e das respostas, assim como não acredito que não sejam todos nós que sinta a maldita por perto a cada novo dia que abrimos os olhos; a cada novo dia que temos a menos na contagem final. Ela está sempre ali e ele sempre soube, procurou; espalhava aos sete ventos e mares e tantos mais que queria era apressar seu encontro e que o resto pudesse ir para o inferno. Eu, apesar da tempestade que sou, sempre quieto fiquei, apenas assistindo, sorrindo, negando e perdoando.

E assim, sempre meio que a perseguindo, meio que lá no fundo querendo fugir dela e sim procurando por só um pouquinho de atenção ou um abraço ou um agrado qualquer, chegou o dia. O dia em que ele, coitado, tão frágil e leve tal qual um anjo ou uma pena ou uma esperança qualquer, ele viu que poderia ir. Poderia ir e sem deixar muito por aqui; tristeza, saudade ou qualquer coceira dentro de um outro alguém. Mas para um, aquele um, esse um que é eu, pois veja bem que merda, ele queimaria um todo a cada cigarro fumado no desespero, a cada dose empurrada para dentro apenas para ser jogada para fora na manhã por vir. Frágil feito a esperança de que algo assim tão deles pudesse, quem sabe, um dia realmente vir a dar certo para sempre e ser como nos filmes que assistiam juntos, nas canções que deixavam rolar altas entre um cigarro e uma trepada e um e outra; só sair daquelas expectativas tão adoradas, ele soube. Ele sentia, certeza. Até mais nada daquilo e nem dele deixar de ser.

Tão parado e calmo, quieto como nunca e ainda mais leve, meu Deus, por dias ele ficou. Silencioso, a respiração falha e pesada, cada fôlego como um novo esforço maior que as tragadas antes tão sagradas, assim não acredito que ele não tenha sentido ela por perto. Mesmo calado, adormecido ou quase ido, não acredito que não tenha pensado a todo segundo "Pois é, meu Deus, fudeu. Agora eu vou". Ele podia não falar, mas certeza eu tinha de que ouvia. E no silêncio branco preenchendo e sobrevoando aquele quarto gelado, eu bem sabia que em sua cabeça neurônios mastigavam a notícia, o desfecho já escrito com quase a data e local decididos. Ele sabia que iria, ele sabia.

Mas ele sempre procurou por isso, não é o que diziam? Não é o que ele mesmo dizia? As noites vividas, os zilhares de maços e corpos e bagulhos e pintos e vaginas e a porra toda que viria no meio, por cima, por trás, entre dedos ou línguas e entranhas. Amores, desamores, ressacas, bad trips, corações partidos e remendados, pregas perdidas, enfim. Tudo aquilo, seu mundo. Tudo aquilo só não mais ido que ele.

Ele, esse anjo tão frágil e pequeno e translúcido; mal compreendido, quase não amado e tão idolatrado. Ele, esse ele, meu Deus, meu tudo e o tudo de todos e o nada de mais alguns e tanta coisa e ainda assim coisa alguma. Ele, meu Deus, e ele? E se ele tiver indo? E nunca mais eu ouvi-lo vindo, nunca mais existir um voltando? Um telefone tocando e aquela voz tão gostosa e nervosa, tremida e rouca pelos tantos cigarros que agora eu me pergunto, "será que ele ainda os terá?". Meu anjo não muito organizado e domado ou bem montado seria sem aqueles vinte. E muito menos com capa, com plástico separando dois corpos para impedir o livre trânsito das almas, não é o que ele dizia? E sem tudo, sem festa, sem eira nem beira? Santo que não do pau oco? E agora? Não haveria mais aquela voz me cantando "vem logo, meu caro, vem que já estou a te esperar com café e braços." E lábios, e dores, cicatrizes e segredos adoecidos, tudo junto. O corpo inteiro e todas as ziguiziras. E se mais nada disso eu tivesse?

Mas a morte, essa companheira constante, a única certeza que tenho na vida, aquela que anda de mãos dadas com a maior das incertezas de quatro letras, pois é, ela resolveu ir passear. E me dar um pouco mais do meu anjo, agora ainda mais frágil e translúcido mas sempre tão lindo. Meu anjo em breve estaria vindo, pois é. Daquela voz e braços e tudo o mais eu ainda teria... até não mais o ter.

E ele, aquele que eu julgava conhecer do avesso mais que conheço meus filmes e músicas favoritos, ele já não era mais aquilo. Já não era mais nada. Era uma folha em branco, molhada, prestes a se desmanchar. E eu, meu Deus, sempre tão afoito e afobado e grosseiro, eu o rasgaria em um simples abraço. Eu e meu cheiro de cigarro, da vida que ainda levava, agora ainda mais desesperada, eu com meu cheiro e essência de eu. Eu o rasgaria, meu Deus.

Distância, distância. Mas eu deveria mostrar apoio, não é mesmo? Parecia tudo agora uma corrida contra o tempo; uma corrida injusta, não dava para trapacear com ele assim tão aos trapos. Era tempo de correr e mostrar o que era amor, "mas amor não, é proibido. Você não precisa selar teu suicídio assim, rapaz", mas amor sim. Mais amor sim.

E então o vi, ali, tão incerto e perdido de si mesmo quanto eu e minhas lembranças poderíamos estar. Sentamos os dois, cada um em sem mundinho, em seu próprio espaço. Sentamos os dois e o ouvi, cada medo novo, cada dúvida e as inseguranças e tudo aquilo que o mantinham perfeito, ainda que todo novo e em branco, ainda que tão outro. Mas aqueles olhos não mudavam, nem a voz já não mais tão rouca pela falta de nicotina que tanto o desesperava. Ouvi-o e permanecemos ali, quietos e barulhentos, certos da incerteza de que seria cada novo passo. E eu permaneceria ali a cada droga pesada e carne que se enfraquecesse, mesmo que o nunca mais viesse para o amor. E tentou vir.

Nunca mais as peraltices, nunca mais os pênaltis a pagar, os cigarros a fumar, as noites a trepar. Nunca mais, nunca mais. Nunca mais o meu amor de pecador a sujar suas novas asas de anjo, nunca mais. Mas eu permaneceria ali, meus olhos cansados mereciam assistir àquele milagre. Das cinzas nunca mais jogadas despretenciosamente da ponta de uma bala, dali renasceria aquele; aquele que seria sempre meu, o meu aquele. Sem capas, sem distâncias, sem nojos ou receios. Meu, para todo o sempre... meu.

E os dias vieram e as mudanças passaram e as inseguranças novamente vestiram outras vestes e os dias se foram e eu permaneci ali. Eu, com a minha voz rouca de nicotina, apenas para ligar para ele e implorar "anda, meu anjo, vem logo. Vem logo que eu 'tô te esperando e cansado de rezar. Anda, se apressa, meu caro. Vem que a nossa hora vai passar e é a minha que está a chegar."

(inspirado livre e loucamente nas minhas viagens sobre a descoberta de CF de sua doença e o anjo que ele deve ter tido, aquele moreno de quem ele tanto falou Depois de agosto).

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

"supere isso, e se não puder superar, supere o vício de falar a respeito"

Suas marcas, todas as tantas, já sumiram da minha pele e eu, sempre tão supersticiosa, já estou a considerar isso um sinal. Um sinal de que, vai saber Deus, talvez todas as minhas incertezas eram certas e nunca vai dar para ser.
E eu estaria tranquila e talvez até orgulhosa de mim mesma se eu tivesse esgotado toda a minha fome, toda a minha vontade de realmente tentar e escapar pela tangente e encontrar um novo jeito de continuar. Mas não, eu 'tô aqui com o tanque cheio; parada num beco sem saída.
E eu poderia sempre fazer ou dar um balão, nunca fui muito boa com ditados e tudo o mais e você sabe disso, falo tudo sempre ao contrário, mas eu poderia simplesmente contornar, dar uma meia volta e voltar. Mas voltar para onde? Não conheço mais nenhum outro lar que não seja você.
Por isso eu tento, experimento tantos outros, me mastigo só por que assim eu me castigo sem nunca deixar marcas e sem ninguém nunca poder notar. Mas de nada me adianta se a cada mordida de mim, provo cada vez um novo sabor teu e continuo na esperança de um dia enjoar.
E eu queria dar as costas e meter o pé, mas sei que seria o mesmo que correr para os únicos braços em que me encaixo como deveria, como sempre precisei. Mas isso é tão errado, tão errado contigo e com tudo que você merece e... legal, sou mesmo hipócrita e egoísta e encasquetada e tudo o mais que quiserem vir me falar outra vez. Mas vai ficar tudo bem, sabe por quê?

Você vai arranjar algo maior, melhor, mais fácil ou só mais bonito. Por que é o que você merece, o que carrega contigo... mentira, não vai não. Não vai ser assim. Você terá muitos outros e muitos outros mais fáceis mas nunca terá um maior, mais bonito ou verdadeiro. Você nunca terá um outro alguém assim tão de inteiro. Não digo isso como quem roga uma praga por que, muito pelo contrário, quero apenas o melhor para você - e talvez seja melhor, quem sabe, exatamente por ser mais fácil. Só digo pois é o que eu sei; essas coisas não são saudáveis, entendes? Se entregar assim, querer se abrir todo e dar de tudo. Pegar o fígado que aguenta meu combustível e largar na tua mão cagando e andando com o que você vai fazer com ele. Isso de pensar tanto nas consequências e nos prós e nos contras e não levar nenhum deles em conta. Não é qualquer um que se dispõe a entrar nessa, criança. Gente boa da cabeça não topa pular do alto de um prédio simplesmente por fazê-lo, por sentir que quer ou até mesmo só se deixar querer. Gente certa das coisas não faz isso não.
Então... é por isso que te digo que não terás outros desses que vai fazer do coração tripas e delas arrancar uma canção. E só digo mesmo porque, lá no fundo, sei que a nossa vai se desmanchar em silêncio tantas frases antes. E o que mais me dói é saber que, pra mim, vai ter sempre aquela fermata ali, aquela pausa com um fim incerto e são esses três pontinhos que, de fôlego em fôlego, me arrancam todos.

Mas se isso te comove ou, quem sabe, me consola, ela não sai da minha cabeça e por incrível que pareça, é a única canção que estou disposta a cantarolar. Ever.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

abrir o seu mundo, acolher quem fora expulso
tal qual um filho pródigo ou cadela vagabunda
derrubar os seus muros, fazer caminho aos murros
guiar por entre bibelôs antigos um novo preferido

baixar a sua guarda, deixar ir e vir e entender e pedir
e medir e ter e perder quem sabe sofrer e até partir
chamar para dentro, para um café um abraço ou um
afago um cafuné até um colo ou o que Deus quiser

oferecer o que era só seu, abrir um novo crediário
acreditar no nome sujo na praça, falado e manchado
despedir os guardas e montar um abrigo no gelo...
quando a geada é si mesmo.

e chamar e pedir de volta e sonhar e esperar e então
colecionar expectativas tomar tudo pelas mãos, não.
perder o controle temperar a razão admirar a paixão
administrar a tensão colecionar o tesão, oferecer a mão

pra que? pra que?
pra assistir o que todo mundo sempre avisou
pra aceitar o que sempre esteve ali em neon
pra aprender que é se dando que se é fudido
tudo por que é acreditando que se vira bandido.
i watch the sky changing colors and my skin burns
the sand, the scratches and the bites - they all become one
i watch you changing colors and my bones, they burn
it's you shifting souls again, wearing different faces again

but everything will dissolve into a magnificent paint
or even fireworks as they explode over the covers
a fever melts your disguises as i hold you closer
your sweet little lies, lullabies, implode my walls

i watch the days run over and my fingers ache
another chance i wasted over a drunk passing dog
i watch you run cheap and something almost hurts
it's you writing better lullabies again, new lies in vain

but everything will dissolve into a thin brief void
or even something even saints would avoid
a fever melts my will as you remain farther
my sweet little will, over, implodes my hopes
a shot for every lie you told
for the times i fucked it over
let's just have a toast, a toast

a dance for every feeling hurt
clap your hands, now it's over
let's just have a toast, a toast.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

merda, merda, merda, merda...

Eu deveria ser proibida de querer pessoas. Assim que minha mente resolvesse que eu havia encontrado um novo amor ou uma obsessão, alguém travestido de papai noel apareceria e me carregaria pelos cabelos para a cadeira elétrica. E o tronco, a fogueira, injeção letal, serra elétrica... a porra toda. Chumbinho também serve, de preferência misturado num risoto de camarão ao molho de pinga. Quero morte na certa.

Cada vez que eu pensasse em me deixar sorrir revivendo palavras, cheiros, qualquer coisa... alguém viria e me atingiria com um hadouken. É sério. Pensei em amar? Trocarei logo por trabalhar, me exercitar, andar... Qualquer verbo que eu pudesse conjulgar sem envolver a bagunça que carrego por dentro. Na mente? Somento evolução, solamente essa merda.

É só que eu me fodo tanto - e fodo tanto com tudo - que estou até pensando em começar a oferecer workshops sobre o assunto: Aprenda Com Jéssica Happatsch Em 24 Horas Como Seguir Se Fudendo a Vida Toda. It's quite a gift, mate. Woody Allen adoraria me conhecer e tomar as escolhas dessa minha vida como inspiração.

Mas o ano só está começando, certo? Estamos na primeira semana útil e se à meia noite e um eu berrei foda-se e não fiz plano algum, penso foda-se agora e monto uma lista para cumprir até aquele dia 31.

O que é meu eu dou para quem eu quiser, seja a vagina ou o coração. Vou ter meu próprio imposto e pagar e parar de procurar por uma mão. Vou seguir forever alone together with my pussy por essa vida e se eu quiser gemer alto, que eu não deixe me calarem com a razão.

Esse ano serei uma puta de respeito e satisfarei meus próprios desejos, seja com o amor da minha vida, o namorado da amiguinha ou a puta amiga de profissão me esperando ali na esquina.

pra falar de saudade

Mas isso não é saudade
Não o é pois não o permito ser
Não é a falta, o vazio ou a insanidade
Não é meu sendo assim de tantos outros seres

Isso não é amor, não é artigo
Não é verbo que de algum modo conjugo
Não tem proposição sem um conectivo
Não há espectativas que se monte sozinho

Mas isso não é saudade
E o que não existe não pode fazer falta
Não é fome, então vai passar, é só vontade
Mas isso não pode ser saudade

O efeito passa e sobra a sobriedade
O canal já se alargou para a tal da liberdade
E eu quero chorar, quero provar da minha própria maldade
Mas não consigo preencher o que não é saudade de verdade.

depois do eu te amo

Certas coisas na vida passam voando. São sempre as boas, é claro. E na maioria das vezes, são dessas que não lembramos. Elas quase que marcam e tudo o mais, só não pesam em ti. São quase que de tinta lavável; bastou uma tempestade de lágrimas ou murros secos em portas e pronto! Lá se foram elas outra vez.
Não tenho nada contra esses momentos felizes, não mesmo. Acho até que de tanto imaginar, protagonizar filmes dentro desse molde em minha cabeça, pode ser que eu goste de viver alguns. É só que eles espetam demais depois de lavados. E espetam muito actually.

Você logo esquece do gosto e o espaço que por tão pouco tempo ocuparam permanece ali - vazio, rangendo e intacto. Um momento feliz vivido é um momento perdido e não há nada, nem uma felicidade igual ou maior, que possa substituir aquela porra. Aí você toma aquele vazio como seu, né? Tenta relembrar, montar tudo que aconteceu em seu devido lugar. A imaginação se põe a trabalhar e rescreeve o roteiro todo torto, sua esquizofrenia e solidão pintando as arestas como você realmente queria que fossem. Mas não são.

Certas coisas na vida não duram e momentos felizes não deixam cicatrizes. O dia seguinte carrega o peso de não conseguir ser tão sublime quanto o agora. E, uns dias depois, você nem sequer se recorda do cheiro, a nicotina e o estresse recheando as fatias que já não são mais suas.
E livros, filmes, boa música ou poesia; nada disso irá te salvar. Você pode se esconder em outros corpos e esperar que aquele peso morto todo cheio de vida te bata à porta novamente. E então voará quase tão sublime quanto o antes. Mas no fundo você sabe que não, nada do que vier depois terá o mesmo sabor. O paladar já provou, se acalmou, se acostumou; nada mais é tão novo, não existem mais outros cantos a se descobrir.

Depois do eu te amo, nada mais é melhor do que uma noite de insônia ou café resquentado. Nada mais ferve ou queima. Depois do eu te amo só resta a esquina a dobrar, o telefone a apagar e a busca a continuar.